Ontem, o Jornal da Cultura abordou a postura de Netanyahu de convocar os embaixadores dos EUA e de países que votaram a favor da resolução anti-assentamentos da ONU. Seguindo a dinâmica do jornal, a notícia foi apresentada e depois a âncora Márcia Bongiovanni abriu espaço para os comentaristas Marco Antonio Villa e Airton Soares falarem sobre a questão.
Enquanto Villa, apesar de crítico a Netanyahu, foi mais geral e diplomático – expondo a questão da complexidade dos conflitos no Oriente Médio e o caráter democrático do Estado de Israel -, Soares não somente passou informações falsas sobre a região ao público, como também fez declarações muito graves com relação ao Exército de Israel (IDF) e aos assentamentos, confira no vídeo abaixo:
A IDF é um DOI-CODI contra os palestinos? Assentamentos vão levar a um Regime de Apartheid em Israel?
Como pode o Jornal da Cultura deixar alguém fazer estes tipos de comentários e comparações falsas e absurdas, ainda mais em se tratando de uma rede de televisão pública e renomada como é o caso da TV Cultura?
OS ASSENTAMENTOS
Para começar, o senhor Airton Soares mente ao afirmar que os palestinos vivem na Cisjordânia há “muitos e muitos milhares de anos”. Primeiro que a região da Cisjordânia foi definida em 1949 quando passou ao controle da Jordânia. Antes disso, a região já atendia pelo nome de Judéia e Samária desde os tempos bíblicos. Segundo, quem vive na região há muitos milhares de anos são os judeus e posteriormente, vieram árabes de outros países. O único período em que os judeus foram proibidos de viver na região na história recente foi entre 1948 e 1967, durante o controle da Jordânia – aliás não só os judeus mas árabes-israelenses também.
Além disso, os povos árabes que habitaram a região da Cisjordânia ao longo da história jamais foram chamados de palestinos. Durante o Mandato Britânico (até depois da independência de Israel), os judeus eram chamados de palestinos, e não os árabes. Os árabes da Palestina começaram a ser chamados de palestinos na década de 60 com a criação da OLP.
Não pode construir essas cidades fortificadas em territórios palestinos.
Em 1967, Israel ganhou a Guerra dos Seis Dias após ser atacado pela Jordânia junto com Egito e Síria, e tomou a Cisjordânia no processo de sua auto-defesa. A Resolução 242 deu a Israel o direito legal de estar na região. Portanto, a afirmação do comentarista é falsa, não só porque Israel tem o direito legal, mas porque a área C da Cisjordânia, onde estão os assentamentos judaicos, não pertence oficialmente aos palestinos, são áreas em negociação.
O EXÉRCITO DE ISRAEL
Soares chamou a IDF de DOI-CODI por seu tratamento aos palestinos. E afirmou “ninguém tem direito, a violência se implanta toda vez que há qualquer tipo de rebelião”.
O DOI-CODI, a polícia da ditadura militar no Brasil, foi uma polícia extremamente violenta e anti-ética, que matava civis deliberadamente e sumia com seus corpos, e torturava até a morte aqueles considerados “inimigos da pátria” com choques elétricos, pau-de-arara, afogamento, injeção de produtos químicos, e tantos outros métodos horrendos.
Dizer que a IDF é o DOI-CODI contra os palestinos, é dizer que a IDF atua da mesma forma que a polícia da ditadura, o que é um absurdo. Veja por exemplo, a onda de ataques palestinos desde setembro de 2015: segundo o Shabak, de setembro de 2015 a setembro de 2016, foram quase 2.000 ataques terroristas de palestinos contra israelenses apenas na Cisjordânia. O números de palestinos mortos no total (em Israel e territórios palestinos) ainda não chega a 250. O que será que o Exército de Israel faz com o resto dos atacantes palestinos? Muitos são presos, passam por julgamentos e podem voltar a suas casas dependendo do resultado. Israel não esconde nenhum corpo, os que não pertencem a ex-integrantes de organizações terroristas voltam a suas famílias para serem enterrados.
O soldado da IDF Elor Azaria, está detido desde março, sendo julgado por ter atirado e matado um terrorista palestino ferido que já estava no chão. Se o Exército de Israel prende seu próprio soldado por ele ter atirado em um terrorista que já estava detido, como pode ser que ele seja comparado ao DOI-CODI? Não faz o menor sentido.
Se os palestinos não tivessem direitos eles não poderiam denunciar a IDF ou atacantes israelenses (por exemplo, o caso da família Dawabshe), eles não passariam por cortes, não teriam direito a advogados. Por último, se a violência se implanta toda vez que há qualquer tipo de rebelião é porque nessas rebeliões, civis palestinos atiram contra soldados israelenses com pedras, coquetéis molotov, explosivos e armas, o que inicia um choque entre os dois lados, geralmente quando a IDF entra em áreas palestinas para capturar terroristas, demolir casas ou desmantelar fábricas e depósitos de armas ilegais.
APARTHEID
A última declaração de Soares foi típica de quem quer atacar Israel a todo custo, mesmo se tiver que usar comparações esdrúxulas:
O que está querendo esse primeiro-ministro? Levar Israel a ter necessariamente um Regime de Apartheid … ?
Deixando os objetivos de Netanyahu de lado, jamais poderia-se dizer que a instalação de assentamentos configura um Regime de Apartheid. Israel não controla a Cisjordânia em sua totalidade para deixar os palestinos transitarem ou não pela região. Existem diferentes zonas dentro da Cisjordânia e cada uma sob um diferente tipo de controle e governo, estipulados até então por acordos entre as duas partes.
Segundo os acordos interinos entre Israel e a OLP de 2000: Zona A, principais áreas árabes, controlada civil e militarmente pela Autoridade Palestina (AP); Zona B, cidades e vilas palestinas onde a AP exerce o controle civil e a IDF, o controle militar; Zona C, considerada em disputa, onde estão os assentamentos judaicos. As áreas estipuladas para estarem sob controle militar israelense receberão o controle necessário para manter a paz e a ordem na região. Por exemplo, muitos ataques terroristas são evitados porque futuros atacantes são pegos nos postos de controle israelenses.
Airton Soares não estava ali na posição de um comentarista. Ele não agregou nenhuma informação inteligente que pudesse realmente contribuir para o debate dos assentamentos e a situação pós-resolução da ONU. Ele apenas aproveitou o espaço para dar sua opinião pessoal, demonizando o Exército de Israel, e esbravejando que Israel está roubando terras dos palestinos às custas de mentiras históricas e comparações infundadas.
Uma vergonha para o Jornal da Cultura, uma vergonha para a TV Cultura.
O HonestReporting entrou em contato com a rede para exigir explicações.
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