Com seu texto “Peres e o fim da esperança”, publicado no O Globo e no Estadão (texto encurtado), a colunista Adriana Carranca mostra que misturar jornalismo e aulas de história pode ser um problema. Sua publicação é simplesmente permeada por comparações ilógicas e clara omissão de informações históricas importantes.
Adriana Fala sobre como os Acordos de Oslo – fruto dos esforços de Shimon Peres – representaram um “marco histórico num conflito sem fim”. No entanto, ao invés da paz, vivenciamos o caminho contrário. Nas palavras da colunista:
Acima nós vemos Adriana colocando a violência palestina e a violência israelense no mesmo patamar: de um lado, “uma onda sem precedentes” de atentados palestinos, do outro (ora vejam), a explosão de grupos de extrema direita israelense. Atentados e surgimento de grupos não são exatamente comparáveis, mas já que ela compara, por que além de citar as ações de dois judeus extremistas, ela não cita nenhum exemplo dos milhares de ataques palestinos contra israelenses após Oslo?
Ela teria muitas opções entre os 2.690 ataques terroristas provenientes da Cisjordânia, e os 1.638 ataques provenientes da Faixa de Gaza, somente até 1999 – para não contar os 5.760 ataques contra israelenses durante os quatro anos seguintes da Intifada lançada por Arafat.
Adriana continua seu texto falando sobre como os assentamentos judaicos avançaram cada vez mais impossibilitando o sonho da paz arquitetado em Oslo. Na verdade, após Oslo, Israel fez as maiores concessões de terra para os palestinos do século (e mesmo assim, Arafat transformou o terrorismo em uma guerra aberta), mas a colunista não cita nenhuma delas.
Em maio de 1994, Israel sai de toda Faixa de Gaza (fora um pequeno trecho de assentamentos israelenses evacuado completamente em 2005) e de Jericó, na Cisjordânia. Em setembro de 1995, apesar do terrorismo proveniente dos territórios da Autoridade Palestina, as duas partes assinam um acordo provisório e as forças israelenses saem das áreas povoadas da Cisjordânia, com exceção de Hebron (cuja transferência foi concluída no início de 1997). De uma só vez, Israel cedeu o controle sobre quase todos os 1,4 milhões de residentes da Cisjordânia. Desde então:
- Quase 60% deles têm vivido inteiramente sob jurisdição palestina (Área A).
- Outros 40% vivem em locais sob autoridade civil da AP e, de acordo com Oslo I, controle militar israelense (Área B).
- Cerca de 2% da população palestina da Cisjordânia continua a viver em áreas onde Israel tem controle completo e a AP mantém “jurisdição funcional” (Área C).
Por último, Adriana ainda coloca a “religiosidade” do país como mais um dos obstáculos à paz:
Primeiro, o número de judeus ortodoxos e ultraortodoxos pode crescer mais rápido que o de judeus seculares, mas isso não significa que eles sejam maioria e nem torna o país mais religioso e conservador. 63% da população em Israel são judeus tradicionais ou seculares, apenas 18% são ortodoxos ou ultraortodoxos, sem contar árabes, cristãos e druzos. Aliás, o fato de a população judaica nos territórios ocupados ser ortodoxa, não impediu, por exemplo, a sua completa retirada da Faixa de Gaza.
Segundo, os “palestinos em Israel” que a autora cita possuem cidadania israelense e, portanto, são árabes-israelenses. Até 2020, eles não passarão o número de judeus, assim como os palestinos em territórios ocupados não o farão. De acordo com o Central Bureau of Statistics em Israel, hoje são pouco mais de 6.3 milhões de judeus e pouco mais de 1.4 milhões de árabes em Israel (incluindo cidadãos israelenses de ambos os povos que moram em territórios ocupados). Até 2020, os judeus serão pouco mais de 7 milhões e os árabes, pouco mais de 2 milhões.
De acordo com o Central Bureau of Statistics palestino, hoje são pouco mais de 2.9 milhões de palestinos na Cisjordânia, incluindo Jerusalém. Em 2020, eles serão pouco mais de 3.3 milhões.
O texto de Adriana não fala sobre Oslo, sobre suas propostas, as que foram concretizadas e as que não foram e por que não foram. Seu texto é simplesmente para empurrar ao leitor mais uma vez a desculpa dos assentamentos, ignorando completamente o terrorismo, misturando conceitos, e colocando Israel como principal criador de obstáculos para a paz.
Apesar de tudo, a esperança na paz persiste entre os israelenses, e muito se deve aos esforços de Shimon Peres. Ele infelizmente não viveu para ver a paz chegar, nem o dia em que Israel será reportado de forma mais justa e precisa mundo afora.
Imagem: Flash90